Já há algum tempo que não publicava nada nesta rubrica. É que o tempo é pouco e a Internet está a fervilhar de tudo e mais alguma coisa, pelo que é difícil seleccionar algo. Contudo, aí há tempos sugeriram-me o visionamento de um vídeo e, por extensão, de todo um canal de YouTube, o de Brutto Suave.
Brutto Suave é, evidentemente, o nome artístico por qual é conhecido um rapper e produtor de conteúdos cómicos que ficou muito recentemente conhecido pela criação de vídeos, supostamente produzidos por inteligência artificial, em especial o «Marquês», relativo a José Sócrates, o «Isto Não É o Bangladesh» e, claro, o «Cripto-Moedas». Para além disso, teve tanto e tão súbito sucesso que deu origem a uma linha de produtos comerciais relacionados com estas paródias, em geral peças de vestuário.
Os vídeos começam ou acabam com a seguinte mensagem ou são por ela acompanhados:
«As personagens deste vídeo, embora baseadas em pessoas reais, são ficcionais e foram criadas através de técnicas ultra-avançadas de I.A. apenas acessíveis a meia-dúzia de humanos.»
Como se não bastasse, e ainda na sequência do artigo que anteriormente publiquei sobre inteligência artificial, o homem continua a fazer verdadeiro serviço público num vídeo em que coloca André Ventura e Mariana Mortágua muito amigos e a advertir os espectadores a terem cuidado e serem críticos para com aquilo que vêem porque nem tudo o que há na Internet é real, muito é ficção e pode induzir em erro. O exemplo dado é aquele mesmo vídeo, de entre os outros do canal.
Também achei muita piada àquele casal oriental em viagem que se perde pelo caminho, chega a Portugal e dá de caras com um enorme cartaz que diz «isto não é o Bangladesh». Ficam contentes por ver que há um sítio com gente tão simpática que dá logo a indicação de que não é este o lugar aonde eles pretendem chegar, retrocedem e continuam a jornada à procura do Bangladesh.
Então e o de André Ventura e Carlos Moedas no elevador? E de Moedas a telefonar a Marcelo? Ou o da reunião do Chega? Ou da tentativa de José Luís Carneiro, Eva e Joacine tentarem criar um rap mais fixe que os três já referidos? Hilariantes ao máximo!
Claro que os melhores são os raps, só comparáveis aos do canal e verdadeira saga «Epic Rap Battles of History». O primeiro que vi foi o «Cripto-Moedas», que é o que tem mais que se lhe diga.
Fogo, até o boneco é espectacular. Já o vídeo dá azo a tanto riso quanto críticas. Não foram poucas.
Nele, é feita uma paródia em que Carlos Moedas critica directamente o seu antecessor na liderança da Câmara Municipal de Lisboa e se ergue em força apesar de lhe apontarem o dedo por causa do desastre do Elevador da Glória e de ser considerado «um choninhas».
Aprendi uma coisa com o vídeo: não sabia que Carlos Moedas era de Beja. Quem diria?
Em grande parte, a paródia faz-se às custas do desastre do Elevador da Glória e talvez a maneira como isso é feito não tivesse sido a mais feliz, até porque, convém lembrar, morreram 16 pessoas e o sucedido foi traumatizante para a cidade e para o próprio Moedas. Mesmo o autarca não é o choninhas armado em mauzão que ali aparece, embora eu compreenda que isso foi concebido para efeitos humorísticos. A cada passo, atira-se contra os estrangeiros e quase que se sente da parte do personagem um certo desprezo para com eles. Talvez o Cripto-Moedas seja assim mas o Carlos Moedas não. Quando se começou a falar em impor limites à imigração, ele foi um dos principais defensores da medida. Foi acusado de tudo e mais alguma coisa mas, como ele próprio disse, tinha legitimidade para opinar sobre o assunto porque a sua esposa é estrangeira. Também não percebi a introdução de Mariana Mortágua e Greta Thunberg, que mais parece Catarina Martins, no vídeo. Aparecem na flotilha a caminho da Palestina, aos beijos e abraços, vem de lá um míssil e rebenta com elas e com os navios. Isso não tem nada a ver com Lisboa ou Carlos Moedas. E depois, se elas jogam ou não noutro campeonato, isso é lá com elas. Enfim, o humor tem de ter limites. Tirando isso, está porreiro! Muito bem feito, com imagens perfeitas de realismo assombroso e perturbador e rimas impecáveis e acutilantes. Se não se conseguir rir ao ver o tele-disco, é inegável que até o maior trombudo soltará sonoras gargalhadas ao ver o Fernando Medina ser surpreendido e bolsar ou ao dar de caras com o Cripto-Moedas. Então e aquela Lis Boa? E as «moedetes»?
Seguiu-se o «Bangladesh». A vaca tourina não está perfeita, parece que foi plantada ali, tem uma luminosidade diferente do resto, mas se esquecermos isso, o vídeo está fenomenal. Até a voz de André Ventura é aqui mais parecida que a de Carlos Moedas no outro acima referido. Houve quem me tivesse dito que Brutto Suave devia ser do Chega. Em entrevista ontem ao Diário de Notícias, ele nega-o. Para mim, não precisava. Neste vídeo, ele faz uma crítica feroz a André Ventura e a Pedro Pinto. Ao primeiro, acusa-o de ser incoerente quando diz que é defensor da família mas depois nem foi sequer capaz ainda de fazer um filho e dá-lhe a entender uma certa taradice ao falar das belas montanhas de Portugal e dando como exemplo as da sua correlegionária Rita Matias. Tanto ele como Pedro Pinto são caracterizados como racistas «embora tenha um guarda-costas preto» (e, se bem me lembro, o braço direito de Ventura no partido há uns anos era um antigo amigo e colega seu de seminário, Luc Mobito, não exactamente branco), sendo que Pinto parecia era ter vontade de matar os estrangeiros. Estrangeiros estes que, note-se, estão sempre sorridentes. Pedro Pinto também aparece a brincar com bonecos de touros e a fazer fífias a vacas. Por último, Rita Matias, que fica presa na cozinha, o que me parece um ataque ao Chega, chamando-o de partido machista. A própria, quando não surge como vítima, está sempre em pose de vaidosa e armada em vedeta. Portanto, muito me espanta um chegano fazer um vídeo destes, a não ser que fosse um opositor à presente liderança. Não. Logo na altura achei que era só alguém a fazer humor sobre política, nada de mais.
O «Marquês» foi o último que vi e é tão acutilante a José Sócrates, o «Dono Disto Tudo», e Ricardo Salgado como a Luís Montenegro, entre outros. A produção está, a todos os níveis, soberba e épica. Até teve direito a cantora lírica com capacete cornudo e tudo! Numa breve expressão muito à Sócrates: porreiro, pá!
Crítica, arte e humor em altos níveis. Porém, como o autor frisa a cada instante, é tudo ficção em prol de entretenimento, mais nada. Não consta que alguém tenha levado a mal. O Chega até aproveitou uma estrofe de um refrão para ilustrar um cartaz de campanha: «isto não é o Bangladesh».
Aguardaremos todos, creio eu, as próximas paródias. É que o que faz falta é animar a malta!
Que a caca esteja convosco!
P.S.: NÃO AO ACORDO ORTOGRÁFICO!!!

